Crônica de Margarete Solange
Envelhecer não me soa
agradável: a velhice é prenúncio da morte. É uma estrada certa, um caminho que
não tem volta. Alguns conseguem frustrá-la por bastante tempo, e então se
desviam dela pelo caminho, e assim, escondendo-se e esquivando-se, prosseguem;
contudo a velhice é a sorte de todos, exceto para aqueles que morrem prematuramente.
Para aqueles que conseguem evitá-la ao longo da vida, um dia ela chega e, entrando
por qualquer fresta descuidada, gloriosamente se derrama malvada sobre suas
cabeças como se tivesse irrompido do nada repentinamente. Nas na realidade, ela
esteve sempre por perto, dia a dia se chegando, estreitando o caminho. A vida é
um existir inocente que nos leva sempre adiante como se estivemos numa estrada
rolante que nos leva ao futuro, mesmo que não façamos qualquer esforço para seguir
em frente. A
vida nos leva com ela, subindo em direção ao alto, todavia não existe anúncio
de nossa chegada ao topo porque não existe um percurso oficial, tampouco linha
de chegada. Não existem regras ou normas para sabermos onde nem quando se dá o
apogeu, e, por vezes, não percebemos que ele passou e não nos demos conta
disso. Descobrimo-nos, então, descendo a ladeira da vida, e essa descida sempre
se mostra mais apressada. Ela, a indesejada velhice, do outro lado nos espreita
amável. Enquanto não nos abraça completamente, anuncia-se aqui, ali e além,
cobrindo com seu manto grisalho os de perto e os de longe, atingindo-nos
indiretamente para dizer, num eco adocicado: “Estou aqui” “Estou aqui”. A
velhice é grande aliada da morte, caminham juntas, lado a lado, desempenhando
funções parecidas, sendo a primeira menos sincera porque disfarça suas
intenções. Para provar que reina, toma como reféns nossos avós e, após entregá-los
para sua aliada, apodera-se de nossos pais... – Vê quem amamos tão intensamente,
envelhecer desassossega nossos corações compassíveis! Esse envelhecer nos leva
juntos, como se em sonho estivéssemos mirando o espelho do futuro: ele sussurra
que a juventude está fugindo de nós... Muitos preferem não traduzir para si
mesmos o balbucio dessa voz.
Fonte
Margarete Solange:
O crente não escolhe,
é um escolhido, 2011, p. 84.
Editora Queima Bucha,
Crônica: Manto Grisalho