Margarete Solange
A natureza me fascina. Mesmo maltratada
pelo homem, castigada pelo sol, torturada pela seca, é motivo para belas
poesias.
O
veículo avança velozmente, como se voltasse no tempo. Olho a paisagem em volta,
é como se o passado estivesse dentro dela. Tudo é tão igual. A natureza não
envelhece. Está tal e qual eu a via quando era criança.”
Interrompi
o meu texto para apreciar a paisagem. Quando tentei prosseguir, fugiu-me a
inspiração. Abri novamente o caderninho de Marina para ler uma crônica na qual
ela comparava as pessoas com a natureza. Ela escreveu dizendo:
“A
natureza é uma arte sem moldura, feita pelas mãos do Criador dos criadores. A
terra seca, o sol causticante, o mato cinzento, empoeirado; tudo isso me faz
lembrar Poço-de-Pedras, o interior onde viveram os meus avós maternos. Um lugar
perdido em meio a uma selva de galhos secos e pedras sem nenhum valor, mas que
para mim e os meus irmãos pequenos eram verdadeiros tesouros, porque éramos
inocentes e aquelas veredas de pedras arredondadas, de cores sem brilho eram
belas para nós.
A
natureza faz-me lembrar algumas vidas humanas. O mato verde seria as pessoas
privilegiadas. As serras inabitadas, isoladas ao longe, aqueles que não têm a
companhia de ninguém ou que preferem ser solitários. As enormes pedras, estas
são iguais aos que nada sentem porque são duros e insensíveis. – Ó pedregosos
corações, quem pode compreender os teus sentimentos? O que pode brotar de teu
chão pedregoso e resistir entre os teus espinhos? Como podes compreender os que
te amam se és como as pedras? Todavia, conforta-me saber que as pedras podem
ser transformadas pela água, que insiste ao longo dos anos sem desistir jamais.
Há
tragédias na natureza, como há nas vidas humanas, mas ela não maldiz os homens,
tampouco o seu Criador. Os galhos secos, quebrados, o rio seco, chão rachado...
Tudo se transforma em belas poesias. Quando desce a chuva e outra vez renova as
suas cores, ela sorri, esquecida dos dias maus.
Até
que ponto os seres humanos são realmente humanos, se fazem tanto mal aos seus
semelhantes? Destroem o mundo em que vivem e atribuem ao Criador a culpa do mal
que fazem a si mesmos.
Se
o tempo voltasse, como podemos voltar ao lugar de onde saímos um dia, eu
voltaria e seria outra vez aquela criança inocente, que conversava com Deus
quando estava sozinha, que chorava às escondidas e transformava as árvores em
companheiras e confidentes dos meus problemas infantis...
Sinto
saudade de correr descalça em meio à chuva, de subir em árvores e pular de seus
galhos, gritando como se fosse um pássaro livre a voar...”
[...]
Os
poetas são pessoas diferentes. São como pássaros: se não podem voar, voam
através da imaginação.
Fotografia de Jorge Luiz
trecho da obra
O Silêncio das Lembranças,
O Silêncio das Lembranças,
Queima-bucha, 2011,
p.200-201,202
p.200-201,202